14 Jan 2018

Gone, girl


Enquanto desfiz a minha árvore de Natal escrevi um texto. Escrevo muito nas alturas mais inusitadas. Escrevo geralmente quando não tenho intenção de o fazer. Escrevo quando conduzo, escrevi muito nos anos em que o caminho me levava até à FCSH. Este texto que agora me fugiu era algo sobre as camadas da árvore, primeiro guardei o anjo, depois a guirlanda branca, depois as bolas, e a árvore apresentou-se nua à minha frente. Uma espécie de metáfora da própria vida em que nos vamos despindo dos artifícios até ficarmos nós mesmos, nus perante nós, uma nudez pura que se revela enquanto envelhecemos, a mais bela e genuína. O texto não era este. Estava bem escrito, chegava à metáfora sem sequer falar nela, era eu aquela árvore, cada vez com menos ornamentos, cada vez mais eu, mas fugiu-me. Ainda o tentei agarrar pelo cachaço, nunca pela cauda, os textos não gostam que lhes peguem pela cauda, mas era demasiado tarde e escapou-me definitivamente por entre as mãos.