29 Nov 2020

Lonjuras

 Hoje quando abri a caixa onde guardei os ornamentos para a árvore de Natal abri a caixa das memórias de uma vida longe e perto. Estava um dia gélido e cinzento, lá pelas quatro, o dia começou a esconder-se e depois subi a rua para um outro mercado onde me aconcheguei com vinho quente. Terei ajeitado o gorro e composto o cachecol, tentativa quase vã de me proteger do frio tão frio, e não sei se terei sido infantilmente feliz nestes gestos insignificantes. A reconstituição da memória gosta de pensar que sim e não serei eu a contrariá-la. Ficarei eternamente plasmada de gorro a aquecer as mãos no copo de vinho escaldante, enrolada no casaco mostarda, e feliz. 

Na rua intermédia comprei os ornamentos de madeira que reencontrei hoje e uma árvore de Natal tosca de troncos de madeira sobrepostos que carreguei comigo sem saber que a faria recordação de um tempo perdido. O frio, o mercado, o gorro, o vinho, a vida livre. Tudo está longe, tão longe que é memória. Abri a caixa. É tarde agora.