Se tivesse de viver de enlatados,
congelados, massa e arroz, viveria, a tudo nos habituamos, e aí vem
adversativa, mas não temos ainda, não tenho e como tal lá me aventurei mais uma
vez fora de portas no encalço de fruta e legumes. Primeira paragem: mercearia
da aldeia. Estavam a chegar brócolos, havia grelos de couve e de nabiça,
agriões, salsa e coentros, espinafres, tudo à porta para apanhar a brisa dos
dias, duas ou três pessoas esperavam cá fora, só entra uma pessoa de cada vez,
e já tinha desaparecido a mulher do cabelo esticado que bufava a cada minuto de
espera naquele dia de sol, um outro, tanta impaciência que tive vontade de lhe
lançar o meu olhar soviético. Lá dentro uma mulher de cabelo todo branco e
modos lentos a quem eu me arrependo de não ter perguntado se precisava de
alguma coisa, em vez de começar ouvir em surdina o povo a 'deslargar'
impropérios ao raio da velha que anda na rua, sim, os velhos, raios os partam
FIQUEM EM CASA, crl!, depois saí com o saco transbordante de morangos a perfumar
a rua e o dia, e a mercearia lá ficou no seu remanso. Segunda paragem numa
grande superficie, desinfectei-me à entrada, já me tinha desinfectado quando
saí da mercearia, e continuei cheia de cuidados e receios, a mulher atrás de
mim na fila trazia ao colo as compras, por apurar ficará se por preguiça ou
precaução, e quase juraria que estava demasiado perto, não que o visse, mas
sentia a presença ameaçadora da mulher, xô, cinco centímetros para trás, vá!,
sois todos prevaricadores até prova em contrário. E por fim, farmácia, estava
perto, fui até a pé, graças aos deuses ninguém me mandou para casa naqueles 100
metros,e não havia varandas, já o farmacêutico bem parecido cumpriu o seu dever
escrupuloso quando lhe pedi uma daquelas mistelas naturais para o sono e que
ele assumiu como um perigoso preparado químico 'está habituada a tomar isto?'
estava sim, senhor, acrescentei um 'infelizmente, ar de coitadinha dá sempre
jeito e eu tenho tanto por usar que resolvi dispensar-lhe uma porção, e também
lhe ocultei que num dia de aflição sozinha no carro à porta da farmácia
emborquei cinco balas de valeriana para conter infelicidades teimosas que ainda
se riram de mim e continuaram ufanas como cauda de gato persa no ar. Meti-me no
carro, deixei as compras à minha mãe, por dar ficaram todos os abraços e beijos
à minha pequenita, e eu debaixo do fogo aberto dos pides de varanda consegui chegar a casa. Sã e salva.Ufa.
No comments:
Post a Comment