19 Jan 2021

Sermões de máscara

 Hoje quando cheguei à aula havia um enorme alvoroço. Diz que lhes proibiram tudo, agora não se podiam juntar na rua, não podiam ir para o parque desportivo almoçar, não podiam ir para o café, não tinham sítio, tudo vedado e tudo proibido. Ora uma mulher não é de pau, uma professora também não, e depois dos números absurdos e tudo à beira do colapso, comecei a sentir uma ira miudinha apenas controlada porque sou professora e porque os adolescentes são adolescentes e às vezes não se lhes pode exigir a responsabilidade que os adultos não têm.  Disse entretanto à Catilina que não lhe admitia o tom, pedi ao Simão à minha frente para largar o telemóvel, e o Marcelo disse que fazia anos amanhã, dezoito. Depois perguntei-lhes se tinham visto as imagens do fim-de-semana, as ambulâncias à porta dos hospitais. Continuaram a arengar um tom abaixo até lhes por fim dizer que um almoço era coisa nenhuma comparado com o colapso iminente, que além dos seus dezasseis anos teriam mais uns setenta para viver, duas semanas em casa, uns almoços mal amanhados seriam o altíssimo preço a pagar para que os pais ou os avós não morressem dentro de uma ambulância à porta do hospital. Houve cabeças baixas e silêncio, a seguir começámos a aula. Ninguém mais reclamou.

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