Enquanto a tarde se adentra de
mansinho, vejo a minha imagem reflectida na porta e lembro-me da frase da minha
amiga Cristina 'envelhecer é uma merda'. O reflexo na porta retorna-me uma
mulher baixa, de cabelos alvoroçados, de corpo tranquilo, nem uma réstia de
inquietação sob a blusa preta semi-justa, o rosto a declinar, rugas em torno
dos olhos. Envelhecer só é uma merda porque nos lembram permanentemente de quem
fomos e o 'quem fomos' resume-se à vaidade de um corpo jovem e porque jovem
mais belo e perfeito, intocado pelo tempo, uma peça de roupa a estrear sem
rugas nem vincos. O passado agrilhoa-nos a algo que talvez nunca tenhamos sido.
Se deixarmos, sufocar-nos-á como as imagens de infâncias e natais felizes, as
que nunca ninguém teve mas que a memória
se terá encarregado de colorir em tons pastel de sorrisos cândidos e camisolas
de caxemira. Envelhecer não é uma merda. É uma réstia de sol decadente que me
incendeia o cabelo nesta tarde abençoada de dezembro. Podemos ser apenas?
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