30 Dec 2018


O rapaz com a cadela branca malhada de preto levantou-se. Está agora do outro lado da rua à conversa com um rapaz igual a ele, do mesmo tamanho, só em azul escuro e sem cadela. O casal descontraído com os gémeos de cerca de um metro cada um também já se foram. Atrás de mim sentam-se quatro mulheres que pressinto, não vejo, e a conversa oscila entre 'mas estás a gozar comigo?' e 'não tens frio?' e 'olha, vamos para aquela ali'. Há uma refilice constante nestas quatro mulheres de idades diferentes, duas delas ainda não sabem que são mulheres, saberão a seu tempo. A conversa é interrompida porque alguém chegou, uma voz de homem e outra de mulher. Trocam cumprimentos, imagino que votos de bom ano. As quatro mulheres desaparecem entretanto. Não estão do outro lado da rua numa outra cor e tamanho, e sei que não estão porque desapareceu o perfume intenso e irritante, uma espécie de inquietação miudinha que se me penetrou na pituitária e sabem os deuses do que este meu olfacto de beagle é capaz. Restabelecida a ordem, aconchego-me no casaco de pêlo cor de labrador e no cachecol do Nepal, nem sei porque vos falo destes pormenores, e penso que todos podem errar, até o Pai Natal que lhes trouxe aquele perfume irritante. É por isso que não acredito nele.

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